sábado, 31 de março de 2012

Chico se foi, mas Bozó continua imperando

Para quem não conhece, Bozó foi um de centenas de personagens criados por Chico Anysio, que fazia questão de mostrar seu crachá de funcionário da Globo e achava que, por isso, era importante e poderia passar por cima dos outros mortais.
Não sei se a intenção foi essa, mas Chico, reafirmando o objetivo do humor perante a sociedade, bolou uma das críticas mais pertinentes que já pude admirar, e que ainda assim era positivo para a imagem da própria TV Globo.

Em um dos poucos episódios que pude assistir (e se alguém encontrar o vídeo peço que compartilhe pois vagamente me recordo), Bozó estava na Escolinha do Prof. Raimundo quando foi questionado pelo professor sobre algo que não era de seu conhecimento. Bozó replicou e se negou a responder, se desfazendo daquilo. Afinal ele trabalhava na Globo. E como já era esperado, seu ouvinte achou aquilo sensacional e começou a indagá-lo:

Bozó trabalha na Globo!
- O que você faz lá?!!?
- Trabalho na Ana Maria Braga.
- Legal, você é diretor dela?
- Não.
- Hum.... você é a Ana Maria Braga?!
- Não, eu fico do lado dela...
- Você é o Louro José?!!
- Não... quase isso!
- Você é o rapaz que faz a voz do Louro José?!?
- Não... eu sou o que troca o jornal quando o Louro faz suas necessidades...



Esse episódio retrata de forma brilhante o ar superior inspirado por milhares de funcionários (não só na Globo, mas várias empresas de ponta como Vale, Petrobrás, EBX) de cargos, digamos, populares, como se fossem grandes executivos ou estrelas. Não que estes possam, de fato, agir com soberba, mas na cabeça dos Bozós, eles devem ser assim.
E, pelo contrário, o que acaba-se vendo pelos corredores dessas empresas são gerentes, diretores e artistas que olham no olho, cumprimentam e agem com cordialidade, enquanto funcionários de cargos hierarquicamente inferiores, andam com suas camisas quadriculadas da Tommy Hilfiger, crachás no peito e narizes apontando para o teto com poses de estrela. Há ainda o tal hábito da avaliação do crachá, no qual desdenham dos que tem crachás de outras cores, como na Petrobrás onde os prestadores de serviços possuem crachás marrons, e na Globo, onde estes possuem crachás na cor branca.

Como reforcei, esse senso de pertencimento deturpado - causado involuntariamente por corporações de sucesso - talvez seja mais comum na Globo justamente pelo impacto que a marca Globo causa na maioria das pessoas, até mesmo nas que a criticam, e a repercussão que suas produções geram.
Mas em todas as grandes organizações é possível encontrar gente com tal comportamento, que andam pelas ruas e sobem nos ônibus com seus impecáveis crachazinhos no peito e suas cordinhas comerciais que estampam o nome das empresas de que tanto se orgulham em trabalhar. Moradores do Jardim Botânico e amigos de 460 ou 439 que o digam.

Compartilhar com amigos e família o prazer de fazer parte de uma grande organização, ter para si o crachá como medalha de uma grande conquista, ter empolgação com a empresa onde se trabalha e vestir a camisa é totalmente positivo - confesso que eu também faço. Mas agir como se fosse "A Empresa", ou como se isso o tornasse superior a alguém ou até mesmo a outros funcionários, é totalmente baixo. É trocar caráter e profissionalismo por status e falta de ética com a própria empresa.
O orgulho de se trabalhar numa grande corporação e a identidade que um funcionário possa vir a ter com a empresa requer controle, e é necessário que ele tenha cuidado consigo mesmo para não se tornar mais um Bozó, e acabar ficando até a sua aposentadoria como um, trocando jornais de baixo do Louro José.

Quem quiser ir mais a fundo, pode dar uma conferida nessa matéria que achei enquanto digitava esse post, do Globo, feita há pouco mais de um mês:


Abraço e comente sobre o que acha a respeito!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

quero comentar!